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Moçambique: Aumentam os sequestros de crianças por grupos armados no norte do país

As autoridades deveriam proteger e reintegrar crianças em risco na província de Cabo Delgado

Uma mãe caminha com suas filhas na comunidade de Saul, na região de Metuge, província de Cabo Delgado, em Moçambique, em 26 de março de 2024. © 2024 Juan Luis Rod/AFP via Getty Images

(Joanesburgo) – Um grupo armado ligado ao Estado Islâmico (ISIS) intensificou os sequestros de crianças na província de Cabo Delgado, no norte de Moçambique, disse hoje a Human Rights Watch. A maioria das crianças sequestradas está a ser usada para transportar mercadorias saqueadas, realizar trabalhos forçados, casamentos forçados e para participar de combates.

Organizações nacionais da sociedade civil e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) relatam que esses sequestros estão a aumentar. Embora o grupo armado, conhecido localmente como Al-Shabab, tenha libertado algumas das crianças sequestradas no início deste ano, várias crianças continuam desaparecidas, e as que retornaram às suas comunidades enfrentam dificuldades de reintegração.

"O aumento de sequestros de crianças em Cabo Delgado se soma aos horrores do conflito em Moçambique", disse Ashwanee Budoo-Scholtz, vice-diretora da divisão da África da Human Rights Watch. "O Al-Shabab precisa poupar as crianças do conflito e libertar imediatamente aquelas que foram raptadas."

Em maio e junho de 2025, a Human Rights Watch entrevistou nove pessoas em Moçambique, incluindo residentes de Cabo Delgado, jornalistas, activistas da sociedade civil e um funcionário da ONU, todos expressaram preocupação com o ressurgimento dos sequestros. "Nos últimos dias, 120 ou mais crianças foram sequestradas", disse Abudo Gafuro, director executivo da Kwendeleya, uma organização nacional que monitora os ataques e presta apoio às vítimas.

A 23 de janeiro de 2025, o Al-Shabab atacou a aldeia de Mumu, no distrito de Mocímboa da Praia, e sequestrou quatro meninas e três meninos. Durante a retirada do Al-Shabab, duas crianças foram libertadas, mas cinco continuam desaparecidas. Em março, o grupo armado sequestrou seis crianças em Chibau para transportar mercadorias saqueadas; quatro foram libertadas no dia seguinte. No dia 3 de maio, o Al-Shabab sequestrou uma menina na aldeia de Ntotwe, distrito de Mocímboa da Praia; em 11 de maio, sequestrou seis meninas e dois meninos perto da aldeia de Magaia, no distrito de Muidumbe.

Quando os combatentes do Al-Shabab "invadem ou atacam aldeias, quase sempre sequestram crianças", disse Augusta Iaquite, coordenadora da Associação Moçambicana de Mulheres de Carreira Jurídica em Cabo Delgado. "Eles as levam para treiná-las e depois as transformam em combatentes."

Quando as crianças que foram sequestradas retornam à comunidade, há poucos recursos para ajudar a sua reintegração, disse a Human Rights Watch. "O país precisa de uma estratégia clara sobre o que fazer quando uma criança, especialmente uma que tenha sido resgatada, retorna", disse Benilde Nhalivilo, diretora executiva do Fórum da Sociedade Civil para os Direitos da Criança.

As organizações da sociedade civil apelaram ao governo moçambicano para que cumpra com suas obrigações, previstas tanto na legislação nacional quanto na internacional, de proteção das crianças moçambicanas.

Constituição de Moçambique e a Lei n. 7/2008, de 9 de julho, Lei de Protecção e Promoção dos Direitos da Criança consagram o dever do Estado de proteger as crianças de todas as formas de violência, exploração e abuso. Além disso, Moçambique é signatário de vários instrumentos internacionais e regionais que garantem os direitos das crianças, incluindo a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança e a Carta Africana sobre os Direitos e o Bem-Estar da Criança. Ambos proíbem explicitamente o sequestro, o recrutamento e a exploração de crianças. O Protocolo Facultativo da ONU à Convenção dos Direitos da Criança sobre o envolvimento de crianças em conflitos armados, ratificado por Moçambique em 2004, proíbe grupos armados não estatais de recrutar ou usar crianças menores de 18 anos.

De acordo com o direito humanitário internacional consuetudinário e o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, as crianças têm direito a respeito e proteção especiais. Recrutar ou usar crianças com menos de 15 anos para participar ativamente de hostilidades é um crime de guerra.

As autoridades moçambicanas deveriam evitar novos sequestros, investigar os casos existentes e processar os responsáveis com respeito ao devido processo legal, e garantir apoio adequado às vítimas, disse a Human Rights Watch. As crianças resgatadas precisam de cuidados médicos, assistência psicossocial e mecanismos de reintegração que garantam a sua proteção e bem-estar.

"O governo de Moçambique precisa tomar medidas concretas para proteger as crianças e impedir que os grupos armados as usem como instrumentos de conflito", disse Budoo-Scholtz. "É necessário garantir que haja medidas robustas de reintegração para que as crianças não sejam ainda mais condenadas ao ostracismo quando voltarem à comunidade."

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